Web Summertime - Capitulo 18




 Just leave the pieces when you go 

Lua sentiu a cabeça latejar quando um feixe de luz tocou seu rosto. Não queria abrir os olhos, sua cabeça parecia uma bomba relógio. Afundou o rosto em alguns travesseiros, abafando um gemido de dor. Não lembrava de ter bebido tanto assim na noite anterior. Esticou o braço para o lado na cama de casal em que estava, procurando instintivamente pelo braço de Arthur, mas ele não estava ali. E com uma pontada mais forte e arrasadora em sua cabeça, que pareceu atingir seu corpo inteiro, ela deu um pulo, sentando na cama, o olhar vidrado e sem enxergar muita coisa, pois seus olhos não estavam adaptados à luz ainda.

- Eu não me importo se você diz que me ama. Saia da minha vida. Eu não sou mais seu namorado. Eu não sou mais seu amigo. Esquece que um dia você falou comigo, Lua - ele suspirou ao ver a garota soluçando - Porque eu já esqueci você - ele riu, melancólico -, docinho.

- Eu não... Não! - Lu levantou, desnorteada, caminhando até a porta. Aquele não era seu quarto. Nem sabia o que diabos estava fazendo ali. As imagens, turvas, da noite anterior, começaram a tomar sua mente, e seus olhos começaram a arder.
A dor daquela lembrança não era apenas emocional.
Era física.
Devia doer tanto quanto alguém lhe enfiando uma faca. Ou mais, muito mais.
Ao abrir a porta, viu uma sombra com a visão periférica.
- Bom dia - Thiago disse, com a escova de dentes na boca, e com um olhar de pena. - Como você tá?
Lua não respondeu. Deixou apenas que suas pernas se movimentassem até Amaral, e que seus braços o envolvessem num abraço desesperado, derrubando a escova de dentes do menino. As lágrimas corriam livremente em seu rosto, e Thiago conseguia ouvir pequenos soluços entrecortados, que lhe doíam. Como doíam.
Lu, calma... - ele disse, passando as mãos pelo cabelo da menina. - Você precisa... Ficar calma.
Lua o encarou com os olhos vermelhos, e viu a preocupação estampada no rosto do amigo.
- Como eu posso ficar calma? Como eu posso... Ficar sem ele? - Lua cuspiu as palavras, chorando novamente. - Eu simplesmente me recuso... Eu me recuso!
Thiago a abraçou de novo, sem dizer nada. Não sabia o que fazer, queria que a dor de Lua fosse amenizada a qualquer custo. Sempre teve esse estranho instinto protetor em relação a ela. Não era assim nem com sua irmã. Na noite anterior, depois de terem ligado para Lu e Arthur insistentemente e não receber resposta, Micael acabara descobrindo com a hostess que eles tinham saído em estados deploráveis da festa. Mas pra nenhum deles aquilo fazia o menor sentido. Não até Soph avistar Brian, e todos saírem correndo de lá.
Lua estava caída no corredor quando chegaram. Seu rosto estava praticamente irreconhecível, tinha chorado tanto que borrara a maquiagem inteira. Ela dizia coisas desconexas entre soluços, e depois de beber um copo de água com açúcar, Ully conseguiu entender o que a amiga tentava dizer.
- Eu e Arthur... O Arthur... terminou comigo.
Tiraram-na dali o mais rápido que conseguiram, e levaram para o quarto de Amaral, enquanto Mel e Micael tentavam fazer com que Arthur abrisse a porta. Não conseguiram absolutamente nada.
Soph e Ully limparam o rosto de Lu e colocaram uma camisola nela, e ainda chorando com a cabeça no colo do próprio Thiago, ela acabara adormecendo. Chay tivera que tomar um calmante, porque simplesmente não aguentava ver a irmã naquele estado. Cinco da manhã. Eram oito, agora. Ninguém tinha dormido nada, a não ser Aguiar, que estava trancado dentro do quarto. Soph estava preocupada que ele tivesse feito algo errado, mas no fundo, ninguém acreditava que ele seria tão idiota.

- Eu preciso vê-lo - Lu disse rapidamente, afastando o rosto do peito de Thiago. - Ele tem que me escutar - a garota fungou.
Amaral a encarou, ainda com a boca cheia de creme dental.
Lu - perguntou, puxando-a pela mão para o banheiro, e cuspindo na pia -, o que aconteceu com vocês?
Lua respirou fundo, sentindo o coração acelerar loucamente.
- Brian. - Ela percebeu que começaria a chorar de novo. Aquilo era ridículo, tinha que ser forte. Não podia ficar engasgando e soluçando na frente de Arthur, logo menos. - Ele armou pra gente.
- Como é? - Thiago arqueou a sobrancelha, intrigado e irritado. - Eu mato aquele...
Lua o interrompeu.
- Eu não sei como ele fez isso e o Arthur não quer acreditar em mim. - Ela respirou fundo. - Mas ele vai acreditar. Nem que eu tenha que bater nele. Nem que eu o obrigue - ela disse, fazendo Amaral rir levemente.
- O Arthur ama você, Lua. Eu não sei direito o que houve, mas ele deve estar machucado pra caralho. Mas fique tranqüila. - Ele sorriu, beijando o rosto da amiga. - Vocês nasceram pra ficarem juntos e vão se entender. - Thiago fez uma pausa. - Epa! Isso não era pra ter soado tão bicha.
Lu riu levemente, e Amaral parecia ter ganhado o dia.
- Eu vou até o quarto dele. Me deseje sorte.
- Toda sorte do mundo, baixinha.

Uma mistura de frases e emoções da noite anterior começaram a borbulhar em sua cabeça quando ela se aproximou da porta fechada do quarto de Aguiar. Suas pernas tremiam, algo parecia ter emperrado em sua garganta e ela mal conseguia respirar. Não aguentaria que ele gritasse e falasse aquelas coisas horríveis de novo. Percebera pela primeira vez, na noite anterior, o quanto era frágil e suscetível a Arthur. Ele poderia a matar só com palavras, se quisesse. Quando ela bateu levemente na porta, viu que Soph estava ali, a olhando, no fundo do corredor, com olheiras imensas e aquele mesmo olhar de Thiago. Bateu novamente, e a porta destrancou.
Ela poderia desmaiar ali mesmo.
Não foi o que ela fez. Não, porque quem estava do outro lado era Micael. A própria Sophia pareceu confusa.
- Oi - Lu disse, ainda tremendo. - Eu preciso falar com o...
- Acabei de invadir o quarto pela varanda, Lu - Micael disse, confuso. - Não faço ideia de como ele saiu daqui. Mas... - Borges escancarou a porta, e Lua observou os lençóis da cama revirados, os pedaços do que seria um vaso totalmente quebrado. Micael acompanhou seu olhar.
- Ops... Aquilo fui eu - ele sorriu, sem graça. - Pulando a varanda.
Lu sorriu brevemente.
- Aquilo, definitivamente não - ele completou, levando um beliscão de Soph.
Lu virou seu olhar para o espelho do quarto. Alguns pedaços de vidro estavam caídos no tapete, mas não eram muitos. A marca no meio do espelho era de um murro. A garota engoliu seco sentiu um arrepio na espinha, mas proibiu a si mesma de voltar a chorar.
- Sua tia vai ficar muito contente com essa nova obra de arte - Soph tentou quebrar o gelo, e então Chay apareceu na porta.
- Aí está você - ele sorriu fraco para a irmã, indo abraçá-la. - Quase me matou de susto ontem, sua babaca.
Lu tentou sorrir.
- Desculpe por isso - a menina ainda tinha o olhar fixo no espelho estilhaçado. - Você viu o...
- Não - Chay franziu a testa. - Aliás... Ele não devia estar aqui?
Chay, Soph e Micael se entreolharam.
- Ele deve ter pulado a varanda... - Sophia concluiu. - Mas não sei como fez isso sem que nenhum de nós visse.
- Se ele socou um espelho e ninguém ouviu - Borges tampou a boca ao sentir o olhar de Chay sobre ele. - Opa! Ai, eu sou um merda mesmo, desculpa, Lu.
Lua apenas fez um sinal com a cabeça.
- Ele não pode estar muito longe - ela disse, depois de um minuto. - Eu vou procurá-lo.
Os três se manifestaram quase ao mesmo tempo.
- Eu você com você!
- Não! - Lu negou. - Eu prefiro fazer isso sozinha. Desculpem.
Ela ia sair do quarto, quando Soph a segurou.
- Amiga, é sério... Você não tá bem, sabe? Acho melhor que algum de nós vá com você.
- Eu posso fazer isso sozinha... - A menina saiu andando, com os três em seu encalço - É SÉRIO! - ela gritou, nervosa. - Parem de me tratar como uma criança! Que inferno! - Lua começou a chorar, vendo os amigos paralisados. - Ah, me... desculpem.
Lu bateu e trancou a porta atrás de si, deixando todos desesperados do lado de fora.

Quinze minutos depois ela abriu a porta, vestindo um short e uma baby look, e um chinelo nos pés. Tinha amarrado os cabelos num coque e era perceptível o esforço que estava fazendo para esconder seu rosto, com o óculos oversized, que mesmo assim não escondia o nariz vermelho.
- Amiga, acabei de fazer panquecas! - Mel disse, sorridente. - Venha tomar café e...
- Não tô com fome, obrigada - ela disse, descendo as escadas. - Eu vou atrás do Arthur.
Ninguém se opôs quando ela abriu a grande porta de vidro. Apenas Micael e Ully estavam do lado de fora, e ela passou por eles, tentando sorrir levemente. Mas era impossível, ela não conseguia fingir.
Lu! - Micael gritou, e veio correndo até ela. - Eu prometo ficar quieto. Juro por Deus que vou calar a boca. Deixa eu ir com você?
- Pra quê? - Lu perguntou, a voz baixa.
- E se você precisar de um abraço no meio do caminho? - O garoto sorriu, e Lua tentou lembrar por que não era tão amiga assim dele antes. Só aquele sorriso já a reconfortava. A garota passou a mão na cintura de Borges, que fez o mesmo em seus ombros.
- Quietinho – disse. e ele sorriu.
- Nham, nham - ele fez um barulho com a boca, fazendo-a rir um pouco, enquanto saíam da mansão.

Lua e Micael tinham visitado o quiosque de seu velho amigo, andado em toda a extensão da praia, ido a vários bares, mas não tinham tido nem sequer sinal de Arthur. Borges via sua amiga cada vez mais preocupada, e então obrigava a si mesmo a vencer o cansaço e continuar procurando. Durante aquele tempo, Lu tinha lhe contado o que acontecera na festa. Para Micael, no entanto, parecia bem claro que ela falava a verdade. Estava começando a achar ridículo esse sumiço de Arthur.
"Ponha-se no lugar dele" - ele pensou, e então preferiu não assumir nenhum lado.
Só queria que os se acertassem. Não seria a mesma coisa com os dois separados.
Resolveu ligar na mansão pela quarta vez. Não precisou dizer nada, Lua entendeu com o olhar que eles não tinham notícias do seu... ex-namorado.
Lu, vamos tomar alguma coisa? - A carinha de Micael a lembrou de um ursinho, ou um cãozinho abandonado. - Muito sol na cabeça. - Ele fez bico, fazendo a garota apertá-lo.
- Ah, me desculpa, querido! Estamos andando há horas sem parar... Acho que nem reparei que...
- Tudo bem - ele a interrompeu, sorrindo, e a puxou pela mão até um quiosque. - Dois sucos de maracujá bem gelados e dois salgados de qualquer coisa boa - Borges pediu, e Lu riu baixo, mas fez uma careta.
- Eu não quero...
- Eu não perguntei se você queria. - Micael lhe lançou um sorriso quase diabólico. - Você nem tomou café da manhã. A não ser que você queira procurar seu docinho online, diretamente de uma cama de hospital, você vai comer esse salgado bem quietinha.
Lu arqueou a sobrancelha e arregalou os olhos.
- Pai, é você? - Ela zombou, fazendo o garoto estender-lhe o dedo do meio e gargalhar.
- É sério, Lu, você precisa...
- Tá, tudo bem. - Ela se deu por vencida, mordendo um pão e batata com cara de má vontade.
Não comera nem a metade, mas Borges estava feliz de pelo menos ter colocado algo no estômago. Quando voltaram a caminhar, Lua parou subitamente, olhando fixamente para o outro lado. Por um instante, Micael achou que todo aquele sol na cabeça tinha lhe cegado, porque ele não via Arthur em lugar nenhum.
Lu? Onde você tá vendo ele?
- Ele? Não tô vendo ele! - Lua franziu a testa, e Borges viu que seus olhos estavam vermelhos. Ela baixou os óculos no mesmo instante.
- O que foi?
- Ontem... Quando a gente brigou - Micael percebeu finalmente que estavam em frente ao prédio de Cory. - Ele jogou uma pulseira em mim.
- A pulseira escrito "docinho" - Lu ouviu Micael completar.
- Você viu a pulseira? - ela perguntou, com o olhar fixo.
Micael riu.
- Você achou mesmo que estávamos num campeonato de futebol? - Ela sorriu, abraçando-a pelos ombros. - Estávamos correndo atrás daquela maldita pulseira.
Lu sentiu uma lágrima quente em seu rosto.
"De novo, não", ela pensou, enxugando-a rapidamente. Nunca tinha chorado tanto que nem naqueles dois dias. Não era assim tão mulherzinha, nem queria ser.
- Eu não acredito nisso... - ela disse com a voz chorosa. - Mas não era aniversário, não era nada, por que ele...?
Micael ficou em silêncio. Sabia que tocar naquele assunto ia escancarar as feridas de Lua. Se sentia estúpido por ter dito qualquer coisa desde o princípio.
Micael? - ela o incentivou.
- Acho que ele só queria te surpreender - mentiu.
"Ele queria dizer que te amava", pensou, e mesmo reparando que Lu não tinha comprado sua desculpa, tentou mudar de assunto.
- Acha que devemos procurar nas ruas de trás? - disse, e Lu continuava com o olhar perdido.
- Precisamos ir até o apartamento do Cory - ela falou, e logo viu a expressão confusa de Borges.
Lu, honestamente, acho que ele não vai se esconder na casa do ator-de-nome-gay... - ele disse e Lu não riu, como normalmente faria.
- A pulseira, Micael. Eu a derrubei ontem quando fui atrás dele. Eu preciso daquela pulseira!
Alguns minutos de ar condicionado pareceram o céu pra Borges, que apenas conduziu a menina até a portaria do prédio, sem dizer nada.

- Nossa... É você mesma! - Cory apareceu na sala após dez minutos de espera. Ele vestia uma samba canção vinho e uma regata branca. Seus cabelos estavam bagunçados e sua cara só provava que tinha acabado de acordar. - Quando a moça me avisou... - ele bocejou - eu pensei que fosse, mas não achei que fosse.
Micael franziu a testa para a criatura atlética e semi-bêbada em sua frente. Ficar perto de Cory não fazia bem para seu ego. Lu tentou sorrir.
- Acho que te acordamos, não? - rla praticamente afirmou. O garoto riu, alisando os cabelos, numa tentativa frustrada de arrumá-los.
-Tudo bem. - Ele a cumprimentou com um beijo no rosto, depois cumprimentou Poynter. - Eu imagino que não tenha vindo aqui essa hora pra me dar parabéns, não vejo presente e sua cara está mais para um enterro.
Sparks dissera aquilo com tanta naturalidade que Lu riu um pouco. - Me desculpe! - Ela tentou sorrir. - Feliz aniversário, Cory!
Eles se abraçaram, depois os dois olharam pra Micael.
- Opa! - ele disse, como se acordasse de um transe. - Parabéns aí, cara!
- Tá, agora me digam a que devo a honra... - Cory se jogou no sofá, depois gritou um nome que nenhum dos dois visitantes entendeu. - Um suco e uma aspirina pra mim, e tudo que meus ilustres convidados quiserem.
- Nós não queremos nada. - Lu disse.
- Uma Coca. - Micael disse ao mesmo tempo, sentindo as bochechas corarem.
- Por que você está triste? - Cory perguntou quando Lua sentou em sua frente.
- Como sabe que eu estou triste? - Ela arqueou a sobrancelha.
- Tá estampado na tua cara, lindinha. - Ele deu de ombros. - O que houve?
- História longa. Você não quer saber.
- Tente. - Cory sorriu, e Lu viu-se desabafando imediatamente com ele.
O cara era praticamente um estranho. Mas ele lhe passava confiança, e ela sentia que podia contar com aquele ator-de-nome-gay para tudo. Pelo interesse do cara, para Micael, ou ele era mesmo gay (não só de nome), ou queria pegar sua amiga. Torceu mentalmente para se tratar da primeira opção, enquanto observava os dois conversarem.

Depois de um longo desabafo, que deixou Cory totalmente boquiaberto, os três começaram a vasculhar a casa atrás da tal pulseira. Estava tudo uma bagunça, o que não facilitava em nada, e os funcionários do buffet estavam organizando as coisas. Lu sentiu que ia parar de respirar ao encarar a porta da despensa. Ficou parada a encarando, por incontáveis segundos, se sentindo a garota mais burra do mundo por ter confiado em Brian e entrado ali voluntariamente. Era tudo culpa dela. Ela era uma idiota.
- Pare de se torturar. - Micael a virou de frente pra ele - Pare.
A garota saiu em passos largos para a sala, sentou no enorme sofá de couro branco e apoiou a cabeça nas mãos, tentando impedir que as imagens da briga voltassem à tona. A pulseira não estava em lugar nenhum. Arthur não estava em lugar nenhum. Ela queria apenas apagar aquela merda de dia da sua vida. Não adiantava chorar, ela precisava agir. Levantou-se, decidida a sair do apartamento de Cory e procurar o que realmente importava, quando Borges apareceu na sala, meio pálido, com o celular na mão. Sparks estava a seu lado, e ela deixou seu corpo cair no sofá antes mesmo que eles dissessem qualquer coisa.
- O que ele... Ele está bem? Aonde ele...? - Lu não conseguia terminar a frase. Borges abaixou em sua frente, sentado na mesinha de centro.
- Ele... Ele ligou pro Thiago.
- ONDE ELE ESTÁ? - Lu tampou a boca ao ouvir o eco de sua voz na sala toda, fazendo com que as pessoas do buffet a olhassem.
- Ele foi embora, Lu - Micael respirou fundo. - Ele voltou pra Londres.

Lua não quis falar com ninguém quando voltaram à mansão. Ele tinha ido embora... Então aquilo realmente era pra valer. Ele realmente não confiava nela. Sentiu uma mistura de decepção, dor e raiva quando trancou-se no quarto e viu o relógio que ele deixara na mesinha ao lado da cama. Teve vontade de pisar nele, mas não o fez. A raiva era uma parte mínima que ela estava se obrigando a sentir. Arrependeu-se quando se jogou na cama, fazendo com aquele perfume maldito tomasse o quarto inteiro, e deixasse que suas lágrimas finalmente escapassem. Ficou ali por alguns minutos, até decidir levantar e terminar de arrumar as coisas na mala. Ao ver seu reflexo no espelho, reparou que a garota que via não era ela. Aqueles olhos borrados não eram dela. Aquela cara de sofrimento... Não a pertencia. Era uma versão muito, muito pior. Pedaços de Lua Suede mal colados numa pessoa irreconhecível. Desviou o olhar, incomodada, e pegou as roupas que faltavam, jogando-as de qualquer jeito em uma mala. Pegou uma outra mala para colocar o resto de sapatos e cosméticos, mas arrependeu-se imediatamente de tê-lo feito.

Flashback...

- Sabe, nós precisamos conversar muito sério. – A garota tirou o sorriso do rosto e Aguiar franziu a testa, confuso e apreensivo.
- Sobre?
- Sobre quem vai ter a guarda da blusa vermelha – Lu disse ainda com a voz séria e Arthur gargalhou muito alto.
- Sinto informar, mas a blusa é minha e eu não abro mão disso!
- Então teremos um problema.

Flashback Off 


- Ótimo... - Ela pegou a blusa e chacoalhou a cabeça. - Só faltava essa.
Lua agradeceu mentalmente quando alguém bateu em sua porta, fazendo-a jogar a blusa que roubara de Arthur na noite em que começaram a se falar direito, dentro da mala.
- Ei, garota! - Mel entrou, com um sorrisinho solidário. - Está melhor?
Lua fez que sim com a cabeça, mesmo que um belo “não” estivesse estampado em sua cara. Melanie a abraçou rapidamente.
- Nós precisamos ir, ok? Não podemos nos atrasar para o voo.
Lu sorriu, fechando a mala, e deu uma olhada ao redor antes de sair do quarto que tinha sido tão importante pra ela durante esses dois meses de férias.

- Voo 421 com destino a Tóquio, embarque imediato pelo portão 14.

- Eu devia ir pra lá - Lu murmurou a primeira coisa que dissera na última uma hora. Thiago arqueou a sobrancelha, confuso.
- Pra lá aonde?
- Tóquio. Longe, muito longe... - A garota deu de ombros, como o olhar perdido no saguão. Amaral segurou sua mão.
- Você vai pra Londres e vai enfiar na cabeça do seu docinho idiota que você não fez nada. E pare de graça. 
Lu sorriu vagamente.
Odiava aeroportos. Odiava aviões, odiava altura, odiava Arthur por não estar ali falando coisas idiotas para que se acalmasse. Como se já não bastasse o voo, ainda por cima naquelas circunstâncias, estava mais que nervosa. Mordeu um Kit Kat enquanto tamborilava com os dedos no joelho de Micael. A cada novo voo anunciado, seu coração vinha até a boca e voltava.

- Voo 178 com destino a Londres, embarque liberado pelo portão 11. 

- É o nosso! - Soph levantou rapidamente, pegando sua bolsa roxa. - Vamos, galera!
Todos começaram a levantar, menos Lu, que continuou sentada, agora fincando as unhas nos joelhos de Borges, impedindo-o de se mover também.
- Outch! Lu! - ele reclamou, dando um tapa meio afeminado em sua mão, que fez Chay e Thiago rirem. - Vamos?
O garoto estendeu a mão em sua direção com um sorriso fofo nos lábios.
Lua não conseguiu tocá-lo.
Seu coração estava disparado. Ela sabia que nada aconteceria, tinha certeza. No entanto, sua pele estava gelando e ela parecia estar a ponto de desmaiar ali mesmo.
- Maninha, você tá bem? - Chay sentou ao seu lado, visivelmente preocupado.
- Eu... - A garota começou a levantar, mas jogou seu corpo na poltrona novamente. - Eu não posso. Eu não consigo.
- Ah, não... - Thiago murmurou, subitamente lembrando do pânico que Lua tinha de altura. Somados ao problema com Aguiar... Aquilo daria em merda.
Alguém anunciou o voo deles novamente.
Lu, por favor, não vai acontecer nada... - Ully disse, sorrindo. - Veja bem, vamos estar com você o tempo todo. É tudo tão...
Lua já não entendia mais o que a amiga dizia, tudo parecia “bla-bla-bla-whiskas sachê” ao seus olhos e ouvidos, enquanto suas mãos tremiam.
Lembrou de quando foram pra França.
Lembrou da voz de Arthur encorajando-a.
E então segurou com força nos bancos.
- Eu não vou.
- O QUÊ? - Quase todos berraram ao mesmo tempo.
- Eu não consigo.
- Você consegue, Lu, pare com isso! - Soph disse batendo o pé no chão. - Você veio sem ele conosco, não veio?
- Você não entende. - Aquilo era ridículo, nem ela entendia. - Eu não posso, EU NÃO CONSIGO!
Lu apoiou a cabeça nos joelhos, nervosa, tonta, e com vontade de chorar. Nunca mais tinha tido uma crise de pânico assim com altura. Viajava com os pais periodicamente, e no máximo dava um mini-chilique dentro do avião, mas alguém a distraía e ela seguia viagem. Sentiu o toque suave de alguém acariciando seus cabelos, e depois ouviu o anúncio de seu vôo de novo.
- Vão vocês - Ela ouviu a voz de Chay - Peguem nossas bagagens quando chegarem lá. Vamos de trem.
Lu levantou minimamente a cabeça.
- Tem certeza? - Mel disse, e Chay assentiu, beijando-a nos lábios rapidamente.
Chay, você não precisa... - Lu sentou e ele a interrompeu.
- Shhh... - disse, abraçando-a. - Preciso que você fique calma. Vamos de trem, você precisa do abraço do seu irmão mais gato e não precisa de mais problemas por hoje. Sem aviões, sem altura, eu e você, ok?
Lu sorriu, apertando Chay com um pouco mais de força.
- Eu te amo. Obrigada.

Lua estava mais calma quando chegaram a Londres por terra firme. Chay era o melhor irmão do mundo. Ficou pentelhando-o com seus problemas a viagem toda, e ele estava ali, sempre sorrindo e acalmando-a. Como as malas tinham viajado com o resto dos amigos, pegaram facilmente um táxi para casa. Ao chegarem, sua mãe já sabia de tudo, coisa que Lu constatou pela intensidade do abraço e pelo fato de Mel, Thiago e Ully estarem ali. Antes que ela começasse a dizer qualquer coisa, Lu respirou fundo, levantou do sofá e pegou o celular na mesinha.
- Eu vou até a casa do Arthur.
Lu, você não acha que... Sei lá, talvez fosse melhor esperar? - Ully disse e Lu negou.
- De forma alguma. Eu preciso resolver isso logo. Ele vai me ouvir.
- Quer que eu te leve? - Thiago se apressou em oferecer, mas ela negou novamente.
- Está tudo bem, eu juro. Só preciso... Vocês sabem. Preciso resolver isso logo.
Chay a beijou na testa antes que ela caminhasse até a porta.
- Boa sorte, maninha!
- Boa sorte - Thiago, Mel e Ully disseram em uníssono.
- Vai dar tudo certo, meu anjo - sua mãe disse, e ela sorriu, confiante.
Mães geralmente sabem o que dizem.

- Merda, mas que caralho! - Arthur gritou enquanto tentava enfaixar a mão cortada sozinho após o banho. - Muito esperto, Arthur, foder a própria mão quando está com raiva! ARGH!
Arthur estava sozinho em casa. Sabia que isso ia acontecer, pois sua mãe tinha viajado com algumas amigas para Miami e só apareceria dali a uma semana. O plano inicial era aproveitar muito bem esses dias com a casa só pra ele. Sequestraria Lu por alguns dias e estariam sozinhos para fazerem o que quisessem, quando quisessem, na hora que quisessem. O plano era perfeito.
- Até aquela vad... - Arthur parou no meio da frase. Como podia ser tão babaca de não conseguir nem xingá-la? - Vadia - cuspiu a palavra com a voz meio alterada, ainda se sentindo mal com isso.
Desceu as escadas só de boxer e foi até a cozinha, ainda lutando com a faixa na mão. O corte era meio feio, sabia que devia dar uma olhada melhor naquilo, mas pelo menos aquela dor amenizava uma certa outra que lhe incomodava mil vezes mais. Pegou uma garrafa de cerveja na geladeira e tomou quase tudo de uma vez só. Tinha passado as últimas horas anestesiado com cervejas, que não faziam efeito nenhum sobre ele. Faziam, claro, com que ele pensasse mais nela e sentisse mais sua falta. Também fazia com que seu ódio por si mesmo só aumentasse. Ele simplesmente tinha que parar de pensar nela! Ele podia ser um merda e ter feito coisas que não aprovaria se Lu fizesse com ele. Mas nunca faria aquilo. N-u-n-c-a. E ainda por cima com...
Ao pensar em Portman, jogou a garrafa com força na parede.
- Você vai sair da minha cabeça... Você TEM que sair da minha cabeça! - fisse, ao lembrar de Lu chorando, e apoiou as mãos na pia, respirando fundo.
Tinha chorado. Que porra de homem chorava por mulher?
Ele, claro. Tinha chorado que nem uma criança no quarto da mansão.
Tinha chorado de novo quando chegou em casa.
Estava farto daquela merda toda.
Ouviu a campainha tocar, e momentaneamente feliz ao se lembrar da pizza que havia pedido antes de entrar no banho, correu até a porta com a carteira na mão boa.
Essa mesma carteira caiu no chão quando ele abriu a porta.

Ela não disse nada. Estava abraçando os próprios braços com aquela cara de quem está procurando alguma coisa para falar. Arthur sentiu o ódio correr pelas veias, paralelamente a um tremor estranho em sua espinha.
- Eu disse pra você se esquecer de mim! - falou entre dentes, e Lu engoliu seco.
- Eu não vou embora enquanto nós não conversarmos - ela respondeu, a voz firme, porém baixa.
Arthur riu, sarcástico.
- Não sabia que você era adepta a acampamentos no meio da rua, Suede - disse, apoiando uma mão na lateral da porta.
Tomou um susto quando ela subiu no degrau, fazendo seu rosto aproximar do dele.
- Você não vai me fazer esperar aqui fora, Aguiar - ela retribuiu com o sobrenome, ótimo. - Você vai me deixar entrar e escutar o que eu tenho pra dizer.
Momentaneamente estupefato por aquela atitude - ele esperava que ela viesse chorando e se derretendo - Arthur chacoalhou a cabeça, e riu novamente.
- Pode parar com o sarcasmo e a ironia, garota. O único direito que você tem aqui é de se colocar no seu lugar pela merda que você fez, calar sua boca e... - Aguiar parou, ao ver o entregador de pizza.
Pegou a carteira no chão, deu uma nota para ele sem mesmo ver, e pegou a caixa. Lua permaneceu parada ao seu lado. Aguiar colocou a caixa para dentro, e então voltou-se para ela.
- Vá embora. Nada que você diga vai mudar o que eu vi.
Arthur ia bater a porta, mas Lu a segurou, e com medo de prender a mão dela e os dois ficarem idiotamente com as mãos enfaixadas, ele abriu de novo.
Parecia outra garota do lado de fora. Outra Lua.
Aquela que ele esperava de princípio. Ainda com a feição firme, seus olhos estavam vermelhos. Tudo o que ele conseguiu pensar por dez segundos foi o quanto odiava fazê-la chorar. Depois ele lembrou que chorou por ela, e então a raiva voltou.
Arthur, por favor... - ela pediu, quase sussurrando. - Por favor.
- Não - respondeu, firme, mas com os joelhos quase tremendo.
- Dez minutos, Arthur. Dez minutos e eu prometo que vou embora.
Aguiar respirou fundo. Talvez ela pudesse provar que ele estava errado. Porra, como ele queria estar errado.
Não que acreditasse nisso. Ele tinha visto muito bem.
- Dez minutos - respondeu, andando até o sofá, deixando-a entrar sozinha e fechar a porta.

Lua sentou no sofá em frente a Arthur. Sentiu-se como se estivesse na polícia ou algo do tipo. Os olhos do garoto que ela tanto amava pareciam interrogá-la. Arthur tentava agir despreocupadamente. Pegou a caixa de pizza e a abriu, pegando um pedaço, sem dizer nada.
- O que houve com a sua mão? - Lu perguntou, mesmo sabendo a resposta. Precisava começar de algum lugar. Fazer Arthur assumir que estava sofrendo parecia um bom jeito.
Ele deu de ombros.
- Honestamente, você veio aqui pra bater papo e fingir que é minha amiguinha, ou pra falar qualquer merda de mentira que você quer que eu acredite?
O balde de água fria que Lua (não) esperava.
Engoliu o choro que já ameaçava aparecer. Firme, muito firme.
Arthur, aquilo tudo foi uma armação. Você precisa acreditar em mim!
- Você que precisa que eu acredite.
- Dá pra você calar a boca e me ouvir? - Lu perdeu a paciência, e ele riu, irônico, enfiando mais um pedaço de pizza na boca. - Eu não sabia que o Brian estaria na festa. Encontrei com ele e dei um chilique, porque achei que ele estava me perseguindo de novo.
- E não estava? - Arthur arqueou a sobrancelha. Ficou quieto assim que viu a cara de Lua.
- Aparentemente o primo dele é amigo do Cory. Bom, ele disse que precisava conversar comigo, e que se eu falasse com ele, ele nos deixaria em paz. Saímos da muvuca, e fomos até a cozinha. Ele me levou até o fundo e disse que era pra eu entrar na despensa...
- E você, garotinha ingênua de cinco anos de idade, entrou... - Arthur gargalhou. - Qual é, Lua? Você acha que eu sou idiota? Puta que pariu, você entrou lá VOLUNTARIAMENTE! - ele finalmente gritou. Se sentiu bem, por um instante.
Lu passou as mãos nervosamente pelo cabelo.
- Ele disse que ia nos deixar em paz. Entrei pra conversar com ele, Arthur. Eu fiquei de olho na chave, eu sei que ele não é boa coisa. Ele ficou me enchendo o saco, e do nada o celular dele tocou, ele não atendeu, deu dois segundos e ele me empurrou e me agarrou - Lu disse com as mãos trêmulas. - E você... E você apareceu.
O silêncio tomou conta da sala da casa de Aguiar. Arthur respirou fundo, limpando a mão em um guardanapo.
- Tá, e como eu entro nisso? - ele perguntou.
- Como assim?
- Como é que o Brian “fez com que eu o visse te agarrando sem você querer” - Arthur fez questão de fazer aspas com os dedos. 
Lua quis dar um murro nele.
- Isso... - ela chacoalhou a cabeça. - Eu não sei. Você foi lá para quê?
Arthur riu.
- Eu só fui lá ajudar uma menina! E eu que ofereci ajuda, uma garçonete! Isso é ridículo, Lua, não faz o menor sentido!
Arthur, para com isso... - Lu quis que sua voz soasse menos estranha. - Você acha mesmo que eu... que eu... - A menina fazia um esforço enorme pra não chorar. Aguiar sabia disso. - Você não confia em mim?
Outch. Confiança.
Arthur já nem sabia mais como aquela palavra se encaixava em seu vocabulário.
Estava completamente cego de raiva e de ciúme.
Arthur... - Lua sussurrou, dando a volta na mesinha e sentando do lado de Aguiar no sofá, tão perto que podia encostar nele. E isso fez os dois estremecerem. - Você não pode estar falando sério quando diz que acreditou naquilo. Eu amo você. - Lu apoiou sua mão gelada na mão dele, que incrivelmente estava na mesma temperatura. - Eu estou aqui quase me rastejando pra ter você de volta. Por favor, volta pra mim... - Ela respirou fundo. - Eu preciso de você. Você... Você confia em mim?
Arthur apertou a mão de Lu com a sua. Ela estava tremendo. Ele a encarou nos olhos pela primeira vez, sentindo cada músculo de seu corpo reagir à proximidade. Era algo com o perfume dela. Algo com o jeito dela. Ele não podia ficar tão perto assim. Ele tocou seu rosto, e então começou a misturar tudo novamente em sua cabeça. 
- Eu não... - Sua voz era nada. Soava como uma bela bicha. - Eu não...
Lua roçou o nariz no dele, fazendo-o apertar sua coxa.
- Eu não posso. Eu não confio em você.
A expressão de Lua mudou completamente. Ele não soube dizer o quê, ou identificar o que era. Ela ficou sem falar por mais de um minuto, o que não era normal.
- Você está muito errado sobre mim, sabia? - disse, levantando e caminhando até a porta. - E um dia você vai se dar conta disso. Cuidado pra não ser tarde demais.
Aguiar não conseguiu dizer nada ao vê-la sair.
Jogou-se para trás no sofá, sentindo-se estranho. Ele a amava e a odiava ao mesmo tempo. Ele sabia que aquilo não ia dar certo. Depois de ficar uns cinco minutos tentando se acalmar, ele caminhou até a janela, olhando atrás da cortina. 
Lu ainda estava lá, sentada em sua escada, com o rosto escondido entre as mãos. Pela forma com que seus ombros se mexiam, estava chorando. Arthur encostou o rosto no vidro, se sentindo um verdadeiro merda. Observou-a por dois minutos, até ela limpar o rosto e levantar, caminhando devagar. Ele encarou o relógio – meia-noite e quarenta e sete - e respirou fundo.
A única coisa que subitamente conseguia pensar era que ela não podia ir embora essa hora da noite a pé e sozinha.
Colocou uma calça jeans que estava jogada por lá e uma camiseta, desceu as escadas correndo e calçou um par de chinelos com as chaves do carro nas mãos. Ela não reparou quando ele saiu da vaga, estava distante. Dirigiu a 10km/h, de longe, vendo a garota se arrastar pelo meio da rua até chegar em sua casa, alguns minutos depois.
Arthur estacionou o carro, encarando a fachada da casa. Viu a luz do quarto de Lu acender e bateu a própria cabeça no volante com raiva de si mesmo.
Como ele podia estar ali, preocupado com ela, depois de tudo o que ela fez?
Preocupado com a segurança dela? 
- Caralho, são dois quarteirões! - Arthur xingou, batendo a mão enfaixada sem querer e arfando de dor. Como ele era ridículo! Tinha ódio, tinha nojo de si mesmo. Olhou para a sombra do corpo de Lu andando de um lado para o outro perto da janela e murmurou: - Você vai sair da minha cabeça. Eu vou esquecer que um dia eu já amei você! Eu... - Ele chacoalhou a cabeça. - Vai ser melhor pra nós dois.


Créditos: Fanfic Obsession.

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